[UPDATE] Quinta do pitaco: As viagens na maionese – parte 2

E continuamos com a discussão sobre as viagens na maionese das comunidades retro. Se você gostou do que eu falei no post anterior, pode continuar a ler. Se você não gostou, pode ler também. E vamos continuar a pirar o cabeção…

Projetos malucos…

Certa vez eu prometi fazer uma lista de projetos malucos que eu vi surgir em comunidades retro, ao longo dos anos. Eu estou mais na comunidade MSXzeira, então as doideiras surgiram na maior parte por lá. Mas isso não é exclusividade dos entusiastas do MSX, toda comunidade tem um maluco sem noção. Isso, sem contar os “projetos” de MSX 3 que surgem por aí

  • O MSX “cúbico”, que era uma arquitetura com 16 Z80s ligados num barramento no formato de um hipercubo. Do mesmo autor que disse que IDE é tão fudeba que eu faço direto no cabo;
  • O CIEL 3++, que virou o primeiro exemplo que eu conheço de financiamento coletivo que deu em nada – e os financiadores perderam todo dinheiro;
  • O MSXOS, um sistema operacional novo para MSX. Felizmente o Nextor surgiu para salvar a pátria;
  • O MSX-UNI, que era uma placa de expansão, a lá Expert 3, mas que seria possível colocar em Experts, Hotbits e gabinetes ATX. Também não viu a luz do sol;
  • O formato de arquivo MBF, para imagens. Pelo menos o Louthrax deu continuidade ao MIF;
  • O MSX Tree Gold, que é um projeto meu (mea culpa) que eu não fiquei buzinando os ouvidos de outros, mas… Eu ainda quero fazer;
  • A ADVRAM, que seria uma maneira de ter acesso direto à VRAM dos MSX, sem ter que fazer o percurso lento que é feito normalmente. A ADVRAM foi até implementada em um emulador, mas depois provou-se que ela era inviável;
  • O projeto EDUCAR, que por si só já rende um longo post explicando-o;
  • O ZGrapher, que cai na mesma categoria que a minha aí de cima, mas é o sonho inacabado de um certo fudeba. O changelog começa em 1989 e ainda não está concluído;
  • Um cartucho com um processador mais poderoso, mas de forma que o MSX controlasse. Essa foi uma ideia que eu dei em 1998, depois de um encontro. Enunciei a ideia na MSXBR-L, sugeri colocarem um Intel 486 nesse cartucho… Choveram pedras sobre minha pessoa. Muitos disseram que a ideia era ridícula, mas dizem, o tempo é senhor da razão, e tá aí o MSXPi que não me deixa mentir.

Bem, esses são os que eu lembro agora. Se eu lembrar mais algum, eu falo. Não dá para negar que todos os projetos são interessantes. Sim, muito! Mas será que são viáveis? Aí é outra questão… Agora, sabe uma coincidência entre quase todos esses projetos?

Quase todos foram escrutinizados a torto e a direito em conversas nos pontos de encontro da comunidade. Inicialmente na MSXBR-L, hoje em dia em comunidades no Facebook, em grupos de WhatsApp e em alguns casos, no fórum da MSX.org. Eu cheguei a ver gente vaticinando que o projeto era inviável e não iria funcionar sob hipótese alguma, apenas baseado na sua própria convicção. Mas nem tentar, tentaram… E já disseram: Não vai funcionar. Ao mesmo tempo, vi gente insistindo loucamente em soluções que na prática, não funcionam.

Projetos que deram certo

Em compensação, alguns projetos saíram. Vamos lá…

E tem mais, desculpe por não estar lembrando do resto. Mas existem outros.

Mas aí que está, existem alguns pontos que são coincidentes entre eles:

  • Não renderam discussões homéricas em pontos de encontro, mesmo porque não tinha muito o que discutir, já estava quase todo feito mesmo quando foi trazido à baila;
  • Foram trabalho de pessoas dedicadas, que começaram, continuaram e terminaram;
  • Eram projetos viáveis.

Eu poderia falar o mesmo dos projetos da Tecnobytes, que aperfeiçoaram projetos já existentes: a interface IDE virou IDE-Mapper;  o cartucho FM virou FM Sound Stereo; a Graphics 9000 virou Powergraph, entre outros. Eles também produziram baseado no que já existia, como a ObsoNET, a Classic IDE de Apple, entre outros.

Mas já repararam que eles não divulgam o que eles estão fazendo? Eu tenho certeza de que eles tem ideias interessantes para produzir, mas tudo tem que ver se é viável. E desculpa, gente, nem tudo é viável. Não é porque surgiu na sua cabeça que é viável. Não é porque você quer que seja assim, que assim será.

Só mudou de lugar…

Como já disse, as discussões migraram da MSXBR-L para os grupos de WhatsApp e comunidades do Facebook. E aí eu passo 2 ou 3 dias sem olhar e encontro 1175 mensagens. O melhor é que a grande maioria é on-topic, ninguém está inundando o grupo com conversas fúteis. O pessoal tem sido cuidadoso em focar o assunto.

Mas os papos viajantes já migraram pro WhatsApp. Aliás, vamos a algumas…

FPGA, a “panaceia universal”

Para muitos, a panacéia universal é o chip FPGA. Tem gente que acha que tudo resolve-se com FPGA. Talvez a paz mundial ou o fim da violência urbana… Mas alguns acham que a solução é FPGA. Lembram da época onde a solução nos seriados era nanotecnologia? Essa era a desculpa para tudo. Ou então…

Vamos a algumas frases que eu já ouvi:

  • Não tem? A gente implementa em FPGA! Moleza! Isso, vindo do sujeito que nunca escreveu uma mísera linha em VHDL…
  • Falta recursos? Mole! Coloca um FPGA com mais portas lógicas, resolvido! E novamente existem chips que são inviáveis em FPGA. Alguns chips de som, por exemplo, não compensam.
  • A gente pega um código pronto em Verilog ou VHDL e joga no chip, tá resolvido! Só que tem que ver se funciona, se tem os mesmos timings, se a implementação está boa, etc.

Não sei quantos conhecem a história por trás do Uzix, mas eu conto: Sempre tinha alguém reclamando das limitações do MSX-DOS 2.41, que era isso e aquilo, e uma pessoa veio e falou: “Ué, existe esse Unix para processadores Z180, o UZI (do Doug Braun), é só compilar ele pra MSX e pronto!” Só, né? O Adriano Cunha resolveu pegar essa tarefa “fácil”, e depois de muitas, muitas, MUITAS noites mal-dormidas e muito trabalho, saiu o UZIX. Que pouca gente usou, infelizmente. Pelo menos parte do trabalho dele está sendo usado no FUZIX.

Ah, já que eu citei a Tecnobytes, alguns falarão que a VSU foi o projeto faraônico deles (VSU, Cardoso, não SVU), e eu vou lembrar a vocês que ela não foi à frente por dois motivos:

  • Preço. Lembro muito bem de ficar dizendo ao Oazem que não adiantava por até a pia da cozinha dentro da VSU, pois ela seria tão cara, mas tão cara que ninguém iria comprar. A ideia é usar o aprendizado obtido com essa “prova de conceito” no projeto da placa-mãe de MSX que a Tecnobytes está fazendo (e sim, o projeto não está parado);
  • O mimimi da comunidade. Como vocês devem lembrar, a VSU é uma placa com alguns VDPs de MSX (V9958 e V9990) funcionando em paralelo. Haveria a necessidade de colocar um circuito dentro de cada MSX para poder desligar o VDP interno, para assim redirecionar todos os comandos pros VDPs externos. E teve gente que disse que não admitiria abrir um dos seus MSXs para colocar esse circuito: O Oazem que dê um jeito, dessa maneira eu não quero! A coisa vai nesse nível, parece que o projeto é dele, não de quem cria.

E por pouco o Oazem não abandonou tudo, largou o MSX e foi só cuidar dos gatos dele… Obrigado Ritcho e Rogério Belarmino, por serem parceiros do Oazem na Tecnobytes.

O estagiário mágico

Como disse lá em cima, a viagem na maionese saiu da MSXBR-L e veio para as comunidades de Facebook e para os grupos de WhatsApp. E num dos grupos onde estou, tem muita gente fumando erva-de-fumo com mofo.

Apareceu por lá um desenvolvedor que está escrevendo um RPG para rodar no Mega-Drive. Muito bacana! E os gráficos estão muito bonitos, ele está fazendo o jogo aos poucos… E já tem gente cobrando (eu disse COBRANDO) uma cópia do RPG para MSX com V9990. O homem ainda nem começou a aprender direito a arquitetura do MSX (que é bem diferente da do Mega-Drive) e já tem gente cobrando cópia!

Outra ideia foi a do estagiário mágico. Explico: Tiveram a ideia de reunir um grupo de pessoas para, mensalmente, remeter uma certa quantia em dinheiro para que fosse contratado um programador em início de carreira (um estagiário foi o exemplo dado) para que ele desenvolvesse programas para MSX. Aí eu paro e penso que esta ideia tem tudo para dar errado, de diferentes formas. Vamos lá:

  • Digamos que sejam 20 pessoas, cada um contribuindo com R$ 50 mensais. Pagariam a esse hipotético programador R$ 1000 mensais. Pouco acima do salário mínimo. E nenhum benefício. Aí eu pergunto: Quanto custa ter um bom programador para uma empresa? Duvido que bons programadores aceitem trabalhar por tão pouco. O corolário então indica que se houver algum programador que trabalhe por 1000 reais mensais, ele não será bom.
  • Suponhamos que exista então esse programador. Se 20 pessoas pagarem R$ 50 mensais, esse programador terá 20 patrões. Serão 20 chefes perturbando ele. Pior, se não há consenso em vários assuntos, em grupos pequenos, muito menos haverá consenso em grupos maiores. Na boa… Ninguém se sujeitaria a tanto por tão pouco.
  • Produção de software não é produção de tijolos. É muito mais a redação de um livro: Tem dias que o autor está inspirado e produz um capítulo inteiro, tem dias em que ele não sai do mesmo parágrafo. Depende muito de inspiração também.
  • Alguém está disposto a pagar salário para esse hipotético estagiário, por alguns meses, para que ele conheça a arquitetura do micro, para a partir dai  possa produzir algo?
  • E por último, por que diabos ninguém tira esses 50 reais e doa para um projeto que você já usa (como o Nextor, o MSX.org ou coisa do tipo), compra um jogo via download digital (como os do Kai), doa para o MSXDevPor que ninguém apoia o programador que já desenvolve?

Projetos de financiamento coletivo

Sugeriram como alternativa que fossem feitos projetos de financiamento coletivo. Recentemente tivemos o sucesso do Nogalious, e seria uma maneira de desenvolver.

Mas um projeto como esse esbarra em pelo menos um problema, que é como planejar a demanda de tempo para a realização? Se o programador é um free lance, é mais fácil para ele programar aquilo que ele se propôs. Mas ao trabalhar 40 horas semanais, é bem provável que o projeto atrase. Afinal, no final do dia o programador quer ver tudo, menos um ambiente de desenvolvimento integrado.

Eu acho mais viável por esse caminho, mas não sei se sairia por aí… Montar o projeto não é trivial. Mas eu acho que este pode ser um caminho.

Bem, na próxima quinta eu fecho o assunto. Vão falando aí embaixo o que vocês acham, já que eu gostaria de parar de só reclamar, e mostrar uma solução viável.

 

Sobre Ricardo Pinheiro

Ricardo Jurczyk Pinheiro é uma das mentes em baixa resolução que compõem o Governo de Retrópolis. Editor do podcast, rabiscador não profissional e usuário apaixonado, fiel e monogâmico do mais mágico dos microcomputadores, o Eme Esse Xis.

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  1. Mais chá de fita K7!

    Esse do estagiário mágico eu fui contra, dei minha opinião no grupo do Whats e no Facebook: sem planejamento eu não darei um centavo ao “estagiário”.

    Boa na lista ai do que deu certo: o cartucho do Aleste Gaiden, de trampo pra fazer o jogo funcionar mas a turma do grupo me ajudou a fazer o danado do jogo rodar.

    Quanto ao FPGA só vejo como uma solução: eliminar portas lógicas, somente. Povo tem a piração louca de “socar” tudo dentro de um chip e depois reclamar que o timbre da PQP não está fiel ao hardware original, convenhamos né…

    Sei que para tudo tem um jeito menos pra morte e desfritar ovo (se bem que esses dias assisti na Discovery Science um pesquisa e execução com sucesso que “desfrita” um ovo), mas o povo tem que focar, chega de tanto hardware mirabolante se não tem software! Mais uma interface para ficar jogada na gaveta? NÃO.

    Já teve vários malucos que apareceram no grupo do Facebook com ideias que não teria como ser executadas pelos limites que o MSX possui, mas uma delas o cara viajou forte na maionese: usar uma interface de rede qualquer e criar outra interface USB para usar o controle do XBOX no MSX e ainda aproveitar a entrada de microfone do controle para um chat de voz via rede enquanto se está jogando! Depois de 1 hora tentando explicar o porque isso seria inviável no MSX, o cara simplesmente postou: é, estou no grupo errado, vou apagar o tópico e sair.

    É cada um que aparece!

    1. Justiça seja feita, o cartucho do Aleste Gaiden é um sucesso, e eu atualizei o post, acrescentando-o.

      Tem gente que acha que essas ideias loucas são um brainstorm, que serão úteis… Mas que na verdade são uma tempestade de bosta. E o pior, acham que estão colaborando com a comunidade. Eu tô ficando velho e de saco cheio disso.

  2. Qual foi o do MSX fo Carchano que perderam dinheiro? Parece que esse assunto é meio tabu na comunidade.

    1. Não, não é tabu, é o CIEL 3++. Foi o crowdfunding antes de existir crowdfunding… Inclusive com os fracassos.

      Ainda não sei se estão legíveis, mas eu passei no scanner os comprovantes de depósito para ajudar a custear o projeto. Só pra não esquecer.

  3. Outra coisa: talvez a coisa mais importante que você falou aí é que precisamos mais de software que de hardware agora. Isso faria a comunidade avançar.

    1. Sim, sem dúvida. Mas aí me vem no pensamento o porque o pessoal investe em hardware, e não em software… Acho que isso pode render algo num papo posterior.

      Mas precisamos MUITO de software, e desde que eu comecei a futucar mais nisso, esbarrei num problema crônico, chamado documentação. Quero ver se puxo esse assunto numa dessas quintas aí.