O texto a seguir é de autoria de Divino Leitão e foi publicado originalmente no grupo da Revista Micro Sistemas no Facebook. Eu apenas formatei, expandi siglas, acrescentei algumas ilustrações, links e anotações (é tudo que você encontrar em itálico). Sendo assim, boa leitura para todos….
O Alessander de Souza Goulart criou um grupo chamado World×Amiga e declara que o objetivo é trollar a linha. Nada contra, muito pelo contrário… falem mal, mas falem do Amiga. Um dos papos que surgiu por lá foi um jogo brasileiro para o Amiga, o Barravento. Acontece que tive uma participação interessante na criação desde jogo e me lembrei que nunca contei a história. Então lá vai….
KARATEKA
Well… tudo começou ainda nos tempos em que a Micro Sistemas chamava os TK de Linha Sinclair, um belo dia decidi fazer um jogo para o TK95. Minha ideia do jogo seria uma sátira do Karateka, o popular jogo para Apple e um dos melhores da época, onde um lutador de Karatê tinha que enfrentar trocentos inimigos até chegar na cela da princesa Mariko, onde só quem jogou até o fim sabe que se não se aproximasse da princesa caminhando o jogador iria…
Bom, como pode ser interpretado como spoiler melhor não ler o próximo parágrafo se não quer saber o que acontece….
Ok… aqui vai o spoiler… se o jogador se aproximar da Mariko correndo, vai receber um tremendo chute nas partes baixas… ao invés do beijinho com direito a perninha levantada (Youtube).
Bom… acho que todo mundo aqui no grupo da Micro Sistemas já jogou Karateka e quem não jogou procure a versão pra PC e jogue… embora nada se compare a ver os gráficos do Apple e jogar naquela época dourada, onde tudo era novidade e programador tinha que extrair água de pedra pra fazer um jogo bom.
Reza a lenda que os gráficos do jogo foram feitos a partir da digitalização de imagens do Chuck Norris, mas nunca confirmei isso. — Na verdade Jordan Mechner filmou seu instrutor de karatê demonstrando alguns golpes e depois desenhou os quadros que precisava por cima (rotoscope).
CAPOEIRECA
Mas vamos ao Barravento… ou melhor, ao Capoeireca, que é o jogo que resolvi fazer, todos que se interessam pela história dos jogos sabem os jogos que fiz, mas só eu conheço os que quase fiz e Capoeireca é apenas um deles.
O roteiro era básico, mas foi muito divertido de fazer, ao invés de descer as catacumbas de um lugar da China (ou seria Japão?) o meu herói brasileiro iria subir um morro, para salvar a mulata Maricota que teria sido raptada pelo português da padaria e no caminho ao invés de lobos ou leopardos iria enfrentar vira-latas, pedras rolando morro abaixo, urubus ao invés de falcões e chefões de fase que minha imaginação criou na época, mas não lembro mais… sempre baseados nos chefões do Karateka original.
Fui bem além do roteiro, como a agenda do Chuk Norris estava lotada (sem contar que acho que ele não luta capoeira) peguei um livro onde tinha as imagens de golpes de capoeira muito bem desenhadas e digitalizei no velho estilo… usando os dedos e desenhando uma por uma. Não vou citar o nome do cara, porque se citar ele pode se materializar e estou muito bem sem a presença… mas era um cara ligado a Micro Sistemas e que infelizmente eu fui o culpado por essa ligação, arregacei as portas da revista (e de minha casa) pra ele e uma das primeiras trairagens que fez foi justamente me afastar de lá, que o Renato Degiovani tentava levantar após a saída da Alda… mas isso é outra história que é melhor nem contar, certos momentos é melhor fingir que nem aconteceram.
Mas voltando ao jogo… eu já tinha personagens se movimentando na telinha do meu TK-95 e como queria fazer algo profissional chamei esse cara aí que não vou citar nominalmente, mostrei o jogo pra ele e pedi para fazer uma música pro jogo, pois entre as coisas que dizia fazer estava listado compositor. Nem sei se foi ele que fez, ma realmente a música apareceu e era legal, tinha um toque de berimbau.
Tava tudo pronto pro jogo ser lançado, mas levou tanto tempo que o TK-95 acabou saindo do mercado, dando lugar aos emergentes MSX e Amiga. Comecei a desenvolver tudo de novo para o MSX, mas eu não dominava a linha MSX como dominava a linha TK e com o tempo o projeto acabou indo pra gaveta, junto com tantos outros.
BARRAVENTO
Normal… isso é parte da minha vida, com o tempo passei a usar o Amiga e comecei a usar micros para aplicações voltadas a educação e para o meio empresarial, especialmente produção de video, como me destaquei no mercado do Amiga, a PCI, que decidiu fabricar o Amiga no Brasil acabou me contratando como consultor e de repente me aparece um jogo que alguém tinha levado para pedir patrocínio da PCI no seu desenvolvimento, o nome era Barravento e apesar de estar sendo apresentado com o nome de outros autores eu sabia bem que o inominado estava por trás do projeto.
O Barravento e o Capoeireca só tem como similaridade o fato de ser jogo de luta, mas alguns elementos do meu roteiro estavam lá, tudo bem, me senti até prestigiado por um trabalho meu ter sido inspiração, ainda que tivesse tirado da gaveta o capoeireca e estivesse pensando em desenvolvê-lo para o Amiga… mas se fizesse isso ia ser taxado de imitador, afinal apesar da falta de jogos nacionais para o Amiga, acho que o mercado não ia receber bem dois jogos com a mesma temática.
Estava em posição de “barrar” o Barravento, bastaria dizer que não gostei e a PCI iria recusar qualquer patrocínio ou apoio, mas a dona Ignez iria ficar indignada se o filho desprezasse a educação que ela se esforçou em dar e se tornasse um traíra.. ainda que fosse por um motivo justo… a doce vingança.
Aprovei o Barravento, elogiei o jogo e pra se sincero nem sei se a PCI financiou mesmo ou não, pois preferi me afastar deste projeto, por motivos óbvios. Mas creio que a PCI financiou sim…. de qualquer forma o jogo foi lançado e digam o que disserem aqueles que não gostam dele… tem o mérito de ter sido produzido no Brasil, por programadores brasileiros, embora a ideia original nem seja necessariamente minha, afinal tudo foi inspirado no Karateka, este sim um jogo digno de nota, mas que não precisa de minha nota.
FECHANDO O PAPO
Até hoje o Capoeireca jaz na gaveta e por ironia eu poderia fazê-lo, como jogo casual, com muito mais facilidade e não está descartado que aconteça. É isso… e só posso agradecer ao grupo World×Amiga, pois sem esse grupo provavelmente nem lembraria do Amiga em minhas preces e provavelmente o Capoeireca continuaria esquecido, assim como este causo, que tem tudo a ver com a Micro Sistemas e tenho o prazer de dividir com alguns amigos que vão saber bem melhor do que estou falando, porque a vida aqui fora também é uma luta e a “Monikô” não perdoa se você se aproximar do jeito errado.
( Grupo da Revista Microsistemas no Facebook )